domingo, 27 de setembro de 2015

A homossexualidade em Portugal





A homossexualidade em Portugal no período histórico foi sobretudo dominada pela ideologia cristã da Igreja Católica Apostólica Romana, que caracteriza a sexualidade como um acto exclusivamente destinado a procriação, pelo que todas as outras actividades sexuais são vistas como pecaminosas e contrárias a Deus. A partir do século XVI a Inquisição encarregou-se mesmo de investigar, julgar e condenar à fogueira a sodomia. Esta visão moralista da sexualidade manteve-se até finais do século XX, apesar da descriminalização que, entretanto, ocorreu, época em que a grande maioria dos homossexuais ainda preferia esconder-se aos olhos da sociedade.
As Descobertas:
As viagens marítimas de longos meses e a reduzida presença de mulheres a bordo, foram factor determinante para aumentar a frequência de ocorrência de casos de homossexualidade a bordo das naus das Descobertas, apesar da forte repressão. O aumento da homossexualidade em ambientes fechados é um fenómeno conhecido, que se relaciona com o isolamento em relação a membros do sexo oposto, e está presente também, por exemplo, nas prisões. A punição para os casos de homossexualidade que eram descobertos ou denunciados podia passar pelo desembarque no primeiro porto onde o navio aportasse, chegando mesmo nos casos mais extremos à execução do "pecador".
A informação que nos chegou tem origem nos relatos dos padres e capitães da naus, como o caso do capitão da nau Esfera em viagem para a Índia em 1548, D. João Henriques, que relatava ao rei que um tal Diogo Ramires, castelhano, "cometera pecado de sodomia" com dois criados de um passageiro nobre. Após queixa dos criados o indivíduo foi executado.[21] Em 1620, em carta do Rei para o seu vice-rei na Índia, podemos ler: "Eu sou informado que nas naus de viagem vão deste Reino muitos meninos que os soldados logo levam para suas casas quando ali chegam as ditas naus, e que alguns usam mal deles".[22]
Já em terra, tanto nas costas de África como no Brasil, os navegadores e, posteriormente os colonos, foram defrontados com costumes e códigos de moral social muito diferentes daqueles a que estavam habituados no seu país: "Os Tupinambá, não contentes em andarem tão encarniçados na luxúria naturalmente cometida, são muito afeiçoados ao pecado nefando, entre os quais se não tem por afronta. E o que se serve de macho se tem por valente e contam esta bestalidade por proeza. E nas suas aldeias pelo sertão há alguns que têm tenda pública a quantos os querem como mulheres públicas."[23] ou nas costas da Guiné, onde era frequente o "vício do bugre", sendo que entre algumas etnias, para além de praticado e socialmente aceite, era até divinizado. [24]
A acrescer aos hábitos diversos dos naturais das terras descobertas e à pressão sexual causada por muitos meses de isoladas viagens por mar, começou a verificar-se a chegada ao Novo Mundo de degredados condenados por sodomia. O receio de generalização de práticas homossexuais, quando a pressão política para colonizar - que implicava não só criar família e gerar o maior número de filhos possível, mas também lutar "virilmente" pelo território conquistado - era enorme, levou o Rei, no regimento de instalação das Capitanias, em 1532, a outorgar autoridade aos capitães-mores para condenar à morte, sem necessidade de autorização prévia da Metrópole, apenas aos culpados de 4 crimes muito graves: traição e aliança com os índios, heresia, falsificação de moeda e sodomia. A possibilidade que os colonos "machos" brancos procurassem conforto sexual com índios ou escravos, reduzindo a sua autoridade e fomentando a ousadia nos oprimidos para se rebelarem, fez com que a homossexualidade fosse ainda mais reprimida nas novas colónias que em Portugal.
A Santa Inquisição:
De 1536 a 1821 a Santa Inquisição, ou o Tribunal do Santo Ofício em Portugal reprimiu a sodomia, "o abominável acto nefando" ou o "nefando pecado". A sodomia era equiparada pela Inquisição aos piores crimes, como a heresia, sendo que o parceiro passivo, na relação, era particularmente penalizado, o que é consistente com um certo "machismo" que também prevalecia nessa altura. Já os actos sexuais entre mulheres eram considerados menos graves, tendo sido mesmo descriminalizados em meados do século XVII. No total, mais de 4000 pessoas foram denunciadas, cerca de 500 presas e 30 queimadas, [25] sendo que várias centenas foram condenadas a desfilar publicamente em autos de fé e a seguir torturadas ou exiladas. Os arquivos da Inquisição de Lisboa sobreviveram em grande quantidade e podem hoje ser consultados na Torre do Tombo, [26] pelo que existe bastante informação sobre as práticas homossexuais da época, a forma como eram vistas pela sociedade, e julgadas e condenadas pela Inquisição. Muitas das vítimas de perseguição por sodomia da Inquisição eram homens pobres, muitas vezes jovens, que recorriam a todo o tipo de esquemas, incluindo a prostituição masculina, para sobreviver. ( Grifo meu)
Outros parecem ter praticado actos homossexuais apenas conjunturalmente: sendo a virgindade das mulheres solteiras fortemente defendidas, os homens jovens recorriam a sexo com outros homens enquanto solteiros, deixando a práctica após o casamento. Há referências a lugares, como a Ribeira das Naus, onde homens se encontravam com outros homens, e há ainda menção a um espectáculo de diversão pública, que seria hoje chamada de show de travestis, a dança dos fanchonos.[27] [28] Como escreveu Isabel Drumond Braga:[29] "A sua (dos fanchonos) identificação era auxiliada pela maneira extravagante como se apresentavam, o uso exagerado da cor, os elementos femininos nas vestes, as maquilhagens, o recurso à depilação e o uso de cabelos longos com madeixas e franjas." ( Grifo meu)
Dos registos da Inquisição constam também exemplos das mais antigas cartas de amor de sodomitas para os seus amados que sobreviveram em Portugal, como as assinadas pelo sacristão da Igreja Matriz de Silves (Portugal), no Algarve, um tal Francisco Correia Neto (a "Francisquinha") que foi denunciado à Inquisição pelo seu vigário, ou as duas cartas de 1652 do padre António Antas Barreto, de Barcelos, a um seu amante, que foi acusado por um frade como "fanchono, somítigo (sodomita) e puto agente (activo), dormindo com um moço que mandou vir de Guimarães… conhecido como o frade rabista"[30]
[20] Daniel Eisenberg, 2004, Efebos y homosexualidad en el medievo ibérico acedida em 30 de Abril de 2007
[21] "Documentação para a História das Missões do Padroado Português do Oriente", compilação de António da Silva Rego, Lisboa, Agência Geral das Colónias, vol. 4, 1950, pp. 82-83
{22} Documentos Remetidos da India ou Livros das Monções, Lisboa, INCM, vol. 6, 1974, pp. 450-451
[ 23 ]Luiz Mott, "Relações Raciais entre Homossexuais no Brasil Colonial", Revista de Antropologia, Univeridade de São Paulo, vol. 35, 1992, pp. 169-90.
[ 24] Processo da Inquisição de Lisboa n.º 352, Arquivo Nacional da Torre do Tombo
[25] Luiz Mott, A Inquisição e a repressão à Homossexualidade no mundo luso-brasileiro Seminário em 21-02-2005 do Centro de Estudos Sociais da Universidade Federal da Bahia, acedido em 21-04-2008
[26] Os 17.980 processos existentes vão ser digitalizados a partir de 2008, pois segundo o director do Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Silvestre Lacerda, estes "são os mais consultados e mais procurados por investigadores nacionais e estrangeiros" Público de 19-02-2008 acedido em 21-04-2008
[27] fanchono eram o termo de calão que designava os homens que procuravam satisfação sexual com outros homens; usavam-se derivativos do termo, como "fanchonice"
[ 28] glbtq, a enciclopédia on-line
[ 29] Isabel Drumond Braga, "Ser Travesti em Portugal no século XVI", Revista Vértice, 2.ª série, n.º 85, Lisboa, 1998, pp. 102-105
[ 30] Amílcar Torrão Filho, "Tríbades galantes, fanchonos militantes: homossexuais que fizeram história", Edições GLS, São Paulo, 2000, ISBN 8586755249






Os Judeus, os cristãos-novos, vieram para o Brasil.

Marranos. Pintura de Moshe Maimon (1893) retrata o Sêder de Pessach realizado secretamente em Espanha, à época da Inquisição.

Por essas práticas o Tribunal do Santo Ofício enviado ao Brasil processou, julgou e condenou centenas deles ao confisco dos bens, à hábito perpétuo, cárcere privado, à prisão e por vezes à morte, ainda que diversos deles tiveram a sorte de ser queimados “em estátua”, mediante uma representação, castigo bem menos cruel do que os que foram sentenciados a “queimar em carne”.

Estes cristãos novos foram mais abundantes na Bahia, no Rio de Janeiro, em Pernambuco e Minas Gerais onde se dedicaram à mineração. Seria exaustivo documentar todos os casos a fim de que se pudesse justificar a enorme lista de nomes usados por sefarditas que publicamos nessa edição, e isso fugiria ao escopo desse trabalho.
No entanto, para aqueles que não tiveram oportunidade de conhecer a história dos formadores dessa nação incluímos aqui um trecho de uma dissertação de Anita Novinsky, no momento a mais renomada pesquisadora sobre o passado judaico do Brasil que menciona a condenação de 57 cristãos novos.
“Apesar do estágio inicial em que se encontram as investigações sobre a população cristã-nova em Minas Gerais, podemos dizer que seu número foi relativamente alto, uma vez que incluía também os "assistentes" que residiam no Rio de Janeiro e na Bahia, mas que passavam longos períodos em Minas Gerais. No "Livro dos Culpados", que é a principal fonte para o conhecimento da população cristã-nova no Brasil, encontramos anotados os nomes de todos os cristãos-novos suspeitos, denunciados ou que foram presos.
Nele estão registrados 150 cristãos-novos residentes ou assistentes em Minas Gerais.
O número de cristãos-novos em algumas cidades do Brasil ultrapassou o número de judeus que viviam em Amsterdã no período de sua maior efervescência econômica e cultural.
Mas devemos ter em mente, que somente é possível obter dados demográficos sobre cristãos-novos em determinadas regiões do Brasil, através da contagem daqueles que foram presos pela Inquisição ou a ela denunciados como judaizantes.
O número total será, portanto sempre impreciso, pois a maior parte dos cristãos-novos que vieram para o Brasil não foram presos, e diluíram-se em meio a população brasileira.
Em Minas Gerais arrolamos, até o presente, aproximadamente 500 cristãos-novos entre denunciados e presos.

Lista de Sobrenomes Judaico Sefarditas de Luso-brasileiros:

Analisando apenas 57 condenados de Minas Gerais temos o seguinte quadro: Os maiores números de prisões de cristãos-novos foram feitas nos anos de grande produção aurífera 1728, 1729, 1730, 1732 e 1734, sendo seu número mais alto em 1728 e 1729, com 8 prisioneiros cada ano.
No Brasil foram queimados 21cristãos-novos (2 em estátua e 19 em carne). Entre os queimados em carne, 8 residiam ou "assistiam" em Minas Gerais, isto é aproximadamente 42%.
Dos prisioneiros do Brasil somente os acusados de judaísmo receberam como sentença a pena de morte.
Foram queimados "em carne" em Minas Gerais:
1) Miguel Mendonça Valadolid 1731,
 2) Diogo Corrêa do Valle 1732,
3) Luís Miguel Corrêa 1732,
4) Domingos Nunes 1732,
5) Manoel da Costa Ribeiro 1737,
6) Luís Mendes de Sá 1739,
7) Martinho da Cunha Oliveira 1747,
8) João Henriques 1748”
(Ser marrano em Minas Colonial, Anita Novinsky Universidade de São Paulo, Revista Brasileira de História)
Nota-se nessa pequena lista, só pelos nomes dos oito condenados que Mendonça, Valadolid, Corrêa, Valle, Miguel, Nunes, Costa, Ribeiro, Mendes, Sá, Cunha, Oliveira e Henriques figuram entre os “cristãos novos” judeus condenados à morte por judaísmo e evidenciam que a presença de um desses nomes numa família pode indicar um passado judaico nas gerações anteriores.
No entanto, noutro de seus livros fartamente documentado:
“Os Cristãos Novos na Bahia, ” (Editora Perspectiva, 1972) Anita Novinsky publica num apêndice de 9 páginas uma lista que inclui dezenas de outros sobrenomes que incluímos aqui apenas para que o leitor se dê por conta da plausibilidade da presente lista já que os sobrenomes usados por judeus sefarditas é ainda muito mais vasto do que aqueles citados em documentos de terra, anais da inquisição, atas de batismo ou sepultamento em cemitérios paroquiais.
Os judeus se misturaram de tal forma na sociedade luso-brasileira que como dizia um rabino, a grande pergunta num país como o Brasil e em seus vizinhos sul americanos não é quem descende de judeu, mas quem não descende.

Apesar disso ai vai nossa lista publicada pela investigadora do passado judaico brasileiro Anita Novinsky cujas obras recomendo efusivamente: Abrantes, Afonseca, Aguiar, Aguirre, Aires, Albuquerque, Almeida, Alvarez, Antunes, Araújo Azevedo, Balão, Barbosa, Batista, Bayão, Bitencor, Botelho, Bragança, Brandão, Bravo, Burgos, Brito, Cação, Caldeira, Campos, Castro, Cordeira, Cardoso, Carvalho, Castanho, Chaves, Cirne, Correa, Correia, Costa, Diamante, Dias, Dinis, Duarte, Evora, Faria, Faya, Fernandes, Ferreira, Floriano, Fonseca, Fontes, Francisco, Franco, Freire, Freitas, Gama, Garcia, Girão, Gois, Gonçalves, Gomes, Gusmão, Henriques, Homem, Leão, Lemos, Lobão, Lopes, Machado, Manso, Marques, Martins, Matos, Maya, Medeiros, Mendes, Menezes, Mentola, Mesa, Miplata, Miranda, Moniz, Moraes, Morão, Moreno, Muacho, Navarro, Nunes, Oliveira, Pacheca, Pais, Paiva, Pantaleão, Paredes, Pereira, Peres, Pessoa, Pimentel, Pinheira, Pinto, Pires, Quaresma, Rego, Ribeira, Ribeiro, Rodrigues, Roseiro, Sabona, Sanches, Saraiva, Sarzedo, Serra, Serrão, Silva, Simões, Soares, Teles, Teixeira, Thomas, Tinoco, Ulhoa, Vasconcelos, Vaz, Veigas, Velho, Vicente, Velloso.
Claro que toda essa lista é só o começo.
Se existe um país no mundo onde imperam nomes usados comprovadamente por judeus, esse país é o Brasil.
Isso pode ser facilmente constatável tomando-se os sobrenomes sefarditas mais conhecidos e confrontando-a com uma lista telefônica de qualquer estado ou região do Brasil.
Alertamos para o fato de que possuir um nome usado por judeus sefarditas ou por marranos (cristãos novos) não significa automaticamente que haja um passado judaico na família, mas isso é uma evidência que não pode ser descartada e que deve ser usada por aqueles que amam a restauração.
A lista que inclui centenas de nomes muito mais que comuns no Brasil deve ser vista como um instrumento que se junta na pesquisa a sua ancestralidade a outros dados como costumes, traços culturais, tradições e evidência de cripto-judaísmo conservadas no passado.

Só para ter uma ideia de quantos luso-brasileiros são descendentes de Israel é bom que se saiba que em 1492, entre 120 e 150 mil judeus espanhóis expulsos pelos reis católicos foram para Portugal e se juntaram aos mais de 100 mil judeus portugueses numa época em que Portugal tinha 1 milhão de habitantes. Sob pressão da Espanha o Rei de Portugal ordenou a conversão em massa dos judeus que não tendo para onde ir se resignaram ao catolicismo. Eles passaram a ser os “cristãos novos”.
 Convertidos à força de um decreto eles passaram a viver o judaísmo escondido, que no Brasil nem foi tão escondido assim, pelo menos até à chegada das visitações do Tribunal do Santo Ofício que servia à mais abominável das práticas, o de caçar bruxas, feiticeiros e hereges, mas sobretudo e principalmente judeus, os “assassinos de deus”.

Edições Comunidade de Israel www.comunidadedeisrael.com.br

 

sexta-feira, 25 de setembro de 2015

As leis da intolerância - Veronica Gomes - 1/8/2015

As leis da intolerância

Considerada abominável, a homossexualidade foi criminalizada pela Igreja, pelo Estado e pela Inquisição com penas que chegavam à morte

Veronica Gomes                                                                                                                                                                                   

      


  • Execução por crime de sodomia – como era chamada a relação entre pessoas do mesmo sexo – na Bélgica do século XVI. (Imagem: Reprodução)
    Execução por crime de sodomia – como era chamada a relação entre pessoas do mesmo sexo – na Bélgica do século XVI. (Imagem: Reprodução)
    No livro bíblico do Levítico, a homossexualidade foi descrita como uma “união abominável”. E segundo o apóstolo Paulo, seus praticantes estavam excluídos do Reino de Deus. Vista pela Igreja medieval como o mais torpe dos pecados da carne, foi associada à luxúria e à animalidade, que descaracterizavam o homem como ser racional. Os resquícios desta mentalidade cruzaram séculos. No Portugal moderno, no século XV, a relação entre pessoas do mesmo sexo foi chamada de “mau pecado”, de sodomia ou “pecado nefando” – ou seja, algo do qual não se deveria falar – por todas as Ordenações do Reino (códigos legislativos portugueses baixados pelos monarcas entre os séculos XV e XVII). Mais que condenada, foi criminalizada pela Igreja, pelo Estado e pela Inquisição, e as penas mais severas incluíam a morte.
    A falta contra o 6º Mandamento da Lei de Deus – “Não pecar contra a castidade” – foi caracterizada pelo padre Raphael Bluteau, no Vocabulario Portuguez e Latino (1712-1728), como uma prática que nem mesmo o diabo era capaz de cometer. E ainda que fosse realizada no âmbito privado, teria consequências coletivas: segundo a tradição judaico-cristã, que associava pecados e castigos divinos, as cidades de Sodoma e de Gomorra foram destruídas devido às práticas repulsivas dos homossexuais. Temia-se que a ira de Deus também se voltasse contra o reino português. Afinal, era expressivo o número de eclesiásticos homossexuais processados pela Inquisição, apesar dos esforços da Igreja e do Estado em promover a reforma de seus costumes e dos leigos (não clérigos), conforme as diretrizes do Concílio de Trento (1545-1563).
    A luxúria ocupou o terceiro lugar na lista dos pecados mortais em algumas constituições diocesanas portuguesas do século XVI. Zelando “pela pureza da religião e pelos bons costumes”, elas condenaram a homossexualidade, que era vista como sensualidade.
    As normas seguidas pelo Arcebispado de Braga, em Portugal, de 1697, afirmavam que os homossexuais violavam a Lei Divina e a própria natureza, e deveriam ser sempre castigados com a morte. Diferenciando os leigos e os eclesiásticos, eram categoricamente contra aqueles que praticavam o “mau pecado” e ordenavam que fossem castigados “conforme o Direito e Leis”. Aos eclesiásticos, previam que “[...] quando algum clérigo ou pessoa de nossa jurisdição for tão infeliz e carecido do lume da razão natural, (...) que seja convencido haver cometido tão feio delito, e pecado, será privado do ofício, e benefício, e qualquer dignidade eclesiástica que tiver; e degredado realmente [...] das ordens, e entregue também à Justiça secular” – isto é, sentenciado à morte.
    Visto como um dos principais desvios morais a ser perseguido, o “pecado nefando” foi criminalizado pelas Ordenações Afonsinas (1476-1477), Manuelinas (1514-1521) e Filipinas (1603). Devido à intensa perniciosidade atribuída a esta prática, a Lei geral mandava que quem a cometesse fosse queimado e “feito por fogo em pó, por tal que já nunca de seu corpo, e sepultura possa ser ouvida memória”. Nas Ordenações Manuelinas, a regra valia também para a homossexualidade feminina, que a partir de então configurou-se como um crime julgado pelas ordenações régias. 
    Execução de criminosos condenados pela Inquisição em Lisboa (s/d). Na lista de delitos perseguidos pelo tribunal eclesiástico e régio estava a homossexualidade. (Imagem: BIBLIOTECA NACIONAL DE LISBOA – PORTUGAL)
    Execução de criminosos condenados pela Inquisição em Lisboa (s/d). Na lista de delitos perseguidos pelo tribunal eclesiástico e régio estava a homossexualidade. (Imagem: BIBLIOTECA NACIONAL DE LISBOA – PORTUGAL)
    As Ordenações Filipinas (1603) confirmaram a pena capital aos homossexuais – também incluindo as mulheres – mantiveram o confisco de bens e a infâmia de seus descendentes. Até mesmo as carícias tornaram-se alvo de censura e passíveis de punições graves, dependendo da contumácia e pertinácia do indivíduo. A tortura, um procedimento judiciário comum nos códigos legislativos europeus, foi introduzida no título referente à homossexualidade: sempre que houvesse culpados ou indícios de culpa, o acusado era torturado para que revelasse os parceiros e quaisquer outras pessoas envolvidas naquela devassidão. 
    Almejando a ortodoxia religiosa e moral de seus súditos, o Estado português criou em 1536 a Inquisição, um tribunal eclesiástico e régio. Na época de sua fundação, a homossexualidade não constava na lista de delitos perseguidos. Só foi incluída no Regimento de 1613, elaborado pelo Bispo D. Pedro de Castilho, Inquisidor Apostólico Geral que, segundo os transgressores, “não perdoava os sodomitas”. Mas os inquisidores não estavam impedidos de julgá-los antes disso. Amparados por breves papais e alvarás régios, que lhes concediam inteira jurisdição sobre os culpados – incluindo os clérigos – poderiam prendê-los e condená-los de acordo com o Direito e as Ordenações do Reino. 
    A homossexualidade foi o único crime moral passível de receber a pena da fogueira pela Inquisição portuguesa. E apesar das disposições de 1613 sobre a questão, o Regimento de 1640 foi, indubitavelmente, mais bem sistematizado. Produzido pelo Bispo e Inquisidor-Geral D. Francisco de Castro, era muito mais completo e dedicou maior espaço ao “pecado nefando”, especificando as penas e as circunstâncias em que deveriam ser aplicadas. 
    As punições aumentavam nos casos de homossexuais considerados devassos e escandalosos, que podiam ser sentenciados a degredo, açoites, confisco de bens e à fogueira. A partir de então, os casos femininos passaram a fazer parte dos regimentos inquisitoriais. Mas após muita discussão, os inquisidores deliberaram, em 1646, retirar de sua alçada a sodomia foeminarum. Aos réus que nada confessassem, estava prevista a tortura. E nem os sacerdotes foram poupados pelo documento. Os clérigos receberiam as mesmas penas dos leigos, exceto a de açoites, e os membros de ordens religiosas ouviriam sua sentença na sala do Santo Ofício. O último Regimento, de 1774, do cardeal da Cunha, confirmou as penas mais enérgicas aos incorrigíveis e devassos.
    A censura, porém, não vinha apenas da Igreja, do Estado e da Inquisição: a comunidade também condenava os homossexuais. Alguns indivíduos chegaram a ser violentos contra os homens da Igreja. A intolerância foi notável e traduzida por atitudes distintas: ora truculentas, ora de repugnância e indignação, deixando nítida a existência de fronteiras que delimitavam o grupo transgressor e a sociedade. 
    A comunidade rejeitou, marginalizou e estigmatizou alguns clérigos e seus amantes, cujo comportamento, muitas vezes escandaloso, suscitava delações. Os eclesiásticos homossexuais violaram não só os códigos de conduta estabelecidos pela comunidade majoritária, mas também infringiram a ética moral e religiosa imposta a eles. Acabavam sob os critérios de avaliação e de julgamento por parte da sociedade mais ampla. 
    Um caso emblemático é o do clérigo de epístola e capelão do terço da Bahia, Amador Amado Antunes. No século XVII, ele foi apontado como homossexual nas ruas de Salvador. Infamado por manter um relacionamento com um jovem, quase foi lançado ao mar durante a travessia que fez em direção a Portugal. O clérigo também enfrentou a repugnância de certos membros da sociedade: alguns até deixavam de lhe dirigir a palavra.
    Ao que parece, o que mais chamava a atenção da população era a amizade excessiva entre homens – ou entre mulheres – e certas condutas vistas como desviantes, que incluíam homens que passeavam de mãos dadas, trocando afagos, abraços, carinhos. O padre Antônio de Souza, por exemplo, foi comparado ao próprio diabo, em 1646, pelo negro Domingos. O sacerdote, ao retornar do Reino para Salvador, pediu o moleque emprestado ao ex-governador de Angola, D. Pedro César. O negro, “após ter o sacerdote colocado seu membro na mão dele denunciante, e lhe dar um beijo, declarou ao Padre que não era clérigo, mas o diabo”. 
    Apesar de todas as censuras, os riscos e as discriminações, alguns clérigos homossexuais pareceram ter uma postura um tanto ousada. Era o caso, por exemplo, do supracitado padre António Guerra, denunciado entre 1684 e 1689 por ser “somítigo e muito amigo de rapazes”, era bastante afamado no “mau pecado”. Mas em vez de baixar a cabeça e se alinhar aos padrões da época e ao seu estado sacerdotal, ele afirmava que “ser fanchono [gay] não era pecado”. Outro personagem audacioso era o sacerdote Antônio Lourenço Veloso, capelão da Igreja de São Nicolau, em Lisboa: gabava-se de sua alcunha “Provincial da Sodomia”. 
    Estas atitudes, que não raro geravam descontentamentos e provocavam denúncias e reações violentas, demonstram um fato: ainda que a Igreja, o Estado e a Inquisição tenham tentado exercer um rígido domínio sobre os “sodomitas”, não conseguiram seu controle absoluto. As transgressões homossexuais de parte do clero indicam que muitos não se vergaram ao discurso de submissão e austeridade veiculado por essas instâncias: em diversas situações, driblaram a vigilância e encontraram brechas para viver como bem queriam. Tudo em nome de seus desejos proibidos.
    Veronica Gomes é autora de Atos nefandos: eclesiásticos homossexuais na teia da Inquisição (Prismas, 2015)
    Saiba Mais
    MOTT, Luiz. “Homossexuais da Bahia”. Dicionário Biográfico (Séculos XVI-XIX). Salvador: Grupo Gay da Bahia, 1999.
    VAINFAS, Ronaldo. Trópico dos Pecados. Moral, Sexualidade e Inquisição no Brasil. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1997.

SITE http://rhbn.com.br/secao/capa/as-leis-da-intolerancia

quinta-feira, 24 de setembro de 2015

Inquisição Portuguesa -2

João da Dinastia de Avis ou Dinastia Joanina, foi a segunda dinastia a reinar em Portugal, entre 1385 e 1581-1582.


O clausulado do Contrato de Casamento de Dom Manuel com Dona Maria de Aragão frutificou como veremos.  

Segundo li um dia “ Dom Manuel voltava a cair numa profunda tristeza ao ver a sua amante, fiel companheira e conselheira dar o último suspiro em 1517”, e esse texto se referia a sua segunda esposa, Dona Maria de Aragão, já que ela havia morrido em Lisboa, no dia 7 de março de 1517.
Segundo consta Dona Maria era uma extraordinária amante na cama para seu marido, o que lhe deixou completamente a mercê dela, era ela que na cama podia pedir tudo, e ser sua conselheira mais intima.
O Soberano a perdoou pelo Pogrom de Lisboa.
Manuel e Maria foram pais de:
1-     João III, Rei de Portugal (1502-1557)
2-     Isabel de Portugal (1503-1539), casada com Carlos V, Imperador da Alemanha que se tornaria mãe de Filipe II de Espanha;
3-     Beatriz de Portugal, Duquesa de Savóia (1504-1538), casada com Carlos III, Duque de Savóia;
4-     Luís, Duque de Beja (1506-1555), condestável do Reino e Prior da Ordem de S. João de Jerusalém, pai do polémico António, prior do Crato;
5-     Fernando, Duque da Guarda (1507-1534), casado com Guiomar Coutinho, Condessa de Marialva
6-     Afonso de Portugal, cardeal (1509-1540), arcebispo de Évora e de Lisboa.
7-     Maria de Portugal (1511-1513)
8-     Cardeal Henrique, Rei de Portugal (1512-1580), Cardeal, arcebispo de Braga, de Évora e de Lisboa, Inquisidor Geral, regente do reino e Rei;
9-     Duarte, Duque de Guimarães (1515-1540), casado com Isabel de Bragança, bisavô de João IV de Portugal
10- António de Portugal (1516) que viveu poucos dias.

Em Lisboa, 13 de dezembro de 1521, morre com 52 anos El-Rey Dom Manuel, o primeiro desse nome, que nasceu para ser somente um Príncipe de Portugal, mas acabou reinado de 25 de outubro de 1495 –ao dia de sua morte, portanto 26 anos 1 mês e 18 dias.
Durante esse tempo, seus Almirantes fizeram a descoberta do percurso para a Índia, a descoberta do Brasil, seus generais conquistaram o Oriente, editou as “Ordenações Manuelina”, fez justiça, e houve um aumento das letras e da cultura – “na câmara da Rainha, parturiente, Gil Vicente em trajes de vaqueiro representou sua primeira peça, o Auto da Visitação ou Monólogo do Vaqueiro”.
Assim, foi em seu reinado que o pequenino Portugal se tornou Senhor de um Império, do Império Ultramarino Português, fazendo dele um dos países mais ricos e poderosos da Europa.
Vale chama-lo de O Venturoso, O Bem-Aventurado ou O Afortunando, Rei de Portugal e dos Algarves, d'Aquém e d'Além-Mar em África, Senhor do Comércio, da Conquista e da Navegação da Arábia, Pérsia e Índia.
Mais...
“ O Rei é morto. Viva o Rei”.

A Aclamação:
O cortejo real que saiu dos aposentos reais em direção ao alpendre da igreja de São Domingos, que desapareceu durante o terramoto de 1755 e onde começou o Massacre de Lisboa de 1506, da Ordem dos Dominicanos, era pela ordem assim composto:
O Porteiro-mor
O Porteiro da maça
O Rei d’ Armas Portugal António Rodrigues
O Rei d’ Armas Algarve Pedro de Évora
O Rei d’ Armas Índia Henrique Ribeiro
Os Arautos chefiados por Martins Vaz
Os Passavantes chefiados por António Camello de Castelo Branco
O Escrivão da Nobreza Jorge Pedroso e o Armeiro-mor António de Almeida

O Meirinho Mor Dom Martim Vaz de Castel-Branco, acumulado as funções de Vedor da Fazenda, junto com Cardeal-Infante Dom Afonso de Portugal, irmão do novo soberano, ocupando o ofício de Capelão Mor da Casa Real.
Depois o Alferes Mor, portando o Estandarte Real enrolado, que só poderia ser desenrolada por ordem do soberano, posição ocupada pelo irmão do novo Rei, Dom Fernando, Infante de Portugal, 1º Duque da Guarda e 1º Senhor de Trancoso.
O Capitão da Guarda Real Dom Francisco de Paula de Portugal e Castro, 1º Conde de Vimioso.
O 9.º Condestável de Portugal em função, o irmão do novo Rei, Dom Luís de Portugal, 5.º Duque de Beja, 5.º Senhor de Moura, Prior da Ordem Militar de S. João de Jerusalém, com sede portuguesa no Crato.

O jovem Príncipe Dom João

Tendo ao lado esquerdo, o Mordomo Mor da Casa Real Dom João de Meneses, 1. ° Conde de Tarouca, Comendador de Sesimbra da Ordem de Santiago, trazendo na mão o distintivo de sua posição que remota ao reinado de Dom João II, ou seja, uma vara com 133,8 cm de altura, 5 de diâmetro e 790 gr, constituída por haste de marfim e castão de ébano em forma de cabeça antropomórfica, representando uma mulher africana.
Camareiro Mor Dom D. Diogo Lobo da Silveira, 2.º Barão de Alvito.
Esmoler Mor Dom Jorge de Lancastre, 2.º Duque de Coimbra desde 1509, 13.º Mestre da Ordem de Santiago e 9.º Administrador da Ordem de Avis, e Grão-Almirante de Portugal.
Gentil-Homem da Câmara Real Dom D. João de Lancastre, 1.º marquês de Torres Novas e futuro 1.º duque de Aveiro, criado em 1535 por D. João III.

No acesso ao  alpendre da Igreja de São Domingos estava o Mestre Sala, Dom Álvaro de Abranches, Comendador da Ordem de Cristo e de Santiago de Beja, Capitão de Tanger e de Azamor, para indicar os locais em que deveria se posicionar os membros do Cortejo Real, e levar o futuro Soberano para saudar a Rainha-viúva, Dona Leonor de Áustria, da Casa dos Habsburgos de Espanha, e demais familiares presentes previamente acomodados mais próximo do espaço vazio, com um estrado com o Trono, o Reposteiro-mor responsável por chegar uma mesa com a coroa, o missal e o crucifixo, e posicionar a almofada e a cadeira ao Rei, e o Chanceler-mor.
No cômodo que dava para o alpendre e anexos estavam: parte da Nobreza, Os Moços da Câmara e os Moços Fidalgos.
Os Oficiais militares, o Secretário de el-Rey, o Corregedor da Corte para o Cível, o Corregedor da Corte para o Crime, o Meirinho Mor, e demais Oficiais de administração e justiça.
Físico-mor - médico do Rei, Cirurgião-mor - cirurgião do Rei, Almotacé Mor, Aposentador Mor, Copeiro Mor, Estribeiro Mor, Monteiro Mor, Provedor das Obras Reais, Tesoureiro da Casa Real, Trinchante, Anadel Mor, Falcoeiro Mor, Caçador Mor Correio-Mor, Coudel Mor, Servidor da toalha, Mantieiro, Copeiro-menor, Servidor da toalha, Mantieiro, Uchão de el-Rey, Sumiler, Corregedores, Alcaides, entre outros.
A Guarda de Câmara, composta por 20 cavaleiros, que dormiam junto ao quarto do Rei, estavam presentes no Alpendre.
O Capitão dos ginetes - comandante da Guarda de Ginetes, composta por 200 cavaleiros, armados com lanças e adargas, que acompanhavam o Rei nas suas deslocações, cercavam a local da Aclamação.  
Com Dom João no estrado, o Rei de Armas clamou a multidão:

“Ouvide, ouvide, ouvide, estai atentos”.

“Após fez uma profunda reverência a Dom João, e iniciou a prática, recitando uma oração. Finda esta, voltou a reverenciar o Rei, e retornou ao seu lugar”.
“ Reposteiro Mor colocou diante de Dom João a mesa com a coroa, o missal e o crucifixo, e uma almofada para que ele se ajoelhasse, o que imediatamente foi feito”.
O Cardeal-Infante Dom Afonso de Portugal, o mais alto prelado da Casa Real, ajoelhou-se junto ao irmão, o mesmo fazendo Dom Jorge de Melo, Bispo da Guarda, e Dom Afonso de Portugal, Bispo de Évora, que seriam as testemunhas do juramento que D. João faria.
Dom João passou o cetro para a mão esquerda, e colocou a mão direita na cruz e no missal, e repetiu as palavras que lhe eram ditas pelo Cardeal-Infante Dom Afonso de Portugal, o mais alto prelado da Casa Real, que também estava de joelhos:

“Juro e prometo com a graça de Deus vos reger, e governar bem, e direitamente, e vos administrar direitamente Justiça, quanto a humana fraqueza permite; e de vos guardar   vossos bons costumes, privilégios, graças, mercês, liberdade, e franquezas, que pelos Reis Meus Predecessores vos foram dados, outorgados e confirmados”.

Todos se levantaram e os prelados retornaram aos seus lugares.
Chanceler-mor leu o Juramento de lealdade dos súditos ao novo Rei:
“Juro aos Santos Evangelhos tocados corporalmente com a minha mão, que eu recebo por nosso Rei, e Senhor verdadeiro, e Natural, o Muito Alto, e Muito Poderoso, o Fidelíssimo Rei D. João Sexto Nosso Senhor, e lhe faço preito, e homenagem segundo o foro destes reinos”.
Ouvisse um ‘Juro’ vindo de diversas partes do Alpendre e dos cômodos anexos, bem como da Igreja, e locais circundantes.
O Arauto chefe Martins Vaz em alto e bom som, declara:
“El Rey Nosso Senhor aceita os juramentos, preitos e homenagens, que os Grandes, Títulos Seculares, Eclesiásticos, e mais pessoas da nobreza que estaes presentes, agora lhe fizestes”.
Declarada a aceitação o Alferes Mor, Dom Fernando, Infante de Portugal, 1º Duque da Guarda e 1º Senhor de Trancoso, desenrolada o Estandarte Real, e aclama seu irmão com a forma tracional da monarquia portuguesa:
 “Real, Real, Real, pelo Muito Alto e Muito Poderoso Senhor Rei D. João III Nosso Senhor”.
As mesmas palavras são gritadas pelos Reis de Armas, e depois por todos os que estavam no local da Aclamação.
E o povo estava no mais completo júbilo e felicidade.
Foi assim que eu imaginei a Aclamação de Dom João III, décimo quinto Rei de Portugal, cognominado O Piedoso ou O Pio pela sua crença religiosa, com 19 anos, no dia 19 de dezembro de 1521, que durou até o dia de sua morte, em 11 de junho 1557, portanto 35 anos 5 meses e 29 dias.
“Ascendeu ao trono quando Portugal possuía cidades fortificadas no Norte de África e os seus marinheiros tinham navegado nos oceanos Atlântico, Índico e Pacífico, espalhando-se pelas ilhas atlânticas, pelas costa ocidental e oriental de África, Índia, Malásia, Ilhas do Pacífico e possivelmente Austrália, China e Brasil. Destacava-se entre as potências europeias do ponto de vista económico e diplomático, mas o país não chegava a um milhão e meio de habitantes. Durante o seu reinado Portugal adquiriu novas colónias na Ásia - Chalé, Diu, Bombaim, Baçaim e Macau. António Mota, Francisco Zeimoto e António Peixoto chegaram ao Japão sendo os primeiros europeus a visitar este arquipélago”.
E Dom João III começou a colonização do Brasil.
Ora, Dom João III herdou «um império vastíssimo, mas demasiado disperso», e esse vasto Império precisava de uma unidade, de algo que o unisse de facto, e o neto dos Reis Católicos lançou mão da mesma formula de seus avós, a Inquisição.
Assim El-Rey pediu ao Papa a Inquisição.
O Papa Clemente VII, nascido Giulio Zanobi di Giuliano de' Medici, era o filho natural, depois legitimidade, de Giuliano de 'Medici, que foi morto na Conspiração dos Pazzi, um mês antes de seu nascimento, e de Fioretta, filha de Antonio Gorini. Quando jovem foi confiado a seu tio Lorenzo, o Magnífico. “Clemente VII foi Mecenas de artistas como Rafael e Michelangelo, e acabou morrendo envenenado, depois de comer uma refeição contento Amanita phalloides, um cogumelo altamente tóxico, em Roma, em 25 de setembro de 1534, apenas 56 anos”.
Sua eleição para o Papado foi em 19 de novembro de 1523, e ele tinha 45 anos.
Foi entronizado em 26 de novembro de 1523, e o fim de seu pontificado foi no dia 25 de setembro de 1534, o mesmo dia de sua morte, portanto governou a Igreja Católica por 10 anos 9 meses e 30 dias.
Nesse período, no dia 17 de dezembro de 1531, lançou a Bula Cum ad nihil magis que instituiu a Santa Inquisição em Portugal, nomeando Frei Diogo da Silva, Franciscano, Inquisidor Geral de Portugal em nome do Papa, mas um ano depois o próprio Soberano Pontífice anulou a decisão.
Mais, em 23 de maio de 1536, já no pontificado de Paulo III, nascido Alessandro Farnese, 220º Papa da Igreja Católica, por pressão do Imperador Carlos V, foi lançada a Bula que restabelecia a Cum ad nihil magis.

Cópia do texto publicado no http://www.cafetorah.com/Historia-da-Inquisicao :
Sua primeira sede foi Évora, onde se achava a corte. Tal como nos demais reinos ibéricos, tornou-se um tribunal ao serviço da Coroa.
A bula Cum ad nihil magis foi publicada em Évora, onde então residia a Corte, em 22 de outubro de 1536. Toda a população foi convidada a denunciar os casos de heresia de que tivesse conhecimento. No ano seguinte, o monarca voltou para Lisboa e com ele o novo Tribunal. O primeiro livro de denúncias tomadas na Inquisição, iniciado em Évora, foi continuado em Lisboa, a partir de janeiro de 1537.
Em 1539 o Cardeal D. Henrique, irmão de D. João III de Portugal e depois ele próprio Rei, tornou-se Inquisidor geral do reino.
Até 1541, data em que foram criados os tribunais de Coimbra, Porto, Lamego e Évora, existia apenas a Inquisição portuguesa que funcionava junto à Corte. Em 1541 foram criados os Tribunais de Coimbra, Porto, Lamego e Tomar. Em 1543-1545 a Inquisição de Évora efectuou diversas visitações à sua área jurisdicional. Mas em 1544 o Papa mandou suspender a execução de sentenças da Inquisição portuguesa e o autos-de-fé sofreram uma interrupção.
Foram, então, redigidas as primeiras instruções para o seu funcionamento, assinadas pelo Cardeal D. Henrique, e datadas de Évora, a 5 de setembro.
O primeiro regimento só seria dado em 1552.
Em 1613, 1640 e 1774, seriam ordenados novos regimentos por D. Pedro de Castilho, D. Francisco de Castro e pelo Cardeal da Cunha, respectivamente.
Foram, então, redigidas as primeiras instruções para o seu funcionamento, assinadas pelo cardeal D. Henrique, e datadas de Évora, a 5 de Setembro. O primeiro regimento só seria dado em 1552. Em 1613, 1640 e 1774, seriam ordenados novos regimentos por D. Pedro de Castilho, D. Francisco de Castro e pelo Cardeal da Cunha, respectivamente.
Segundo o regimento de 1552 deviam ser logo registadas em livro as nomeações, as denúncias, as confissões, as reconciliações, a receita e despesa, as visitas e as provisões enviadas "para fora". A natureza dos documentos dos tribunais de distrito é idêntica, visto que a sua produção era determinada pelos regimentos e pelas ordens recebidas do inquisidor-geral ou do Conselho e obedecia a formulários.
Ao mesmo tempo, diz o livro «D. João III» de Paulo Drumond Braga, página 136, o pontífice emanou sucessivos perdões gerais aos cristãos novos em 1546 e 1547. Em 1547 Paulo III autorizou que o Tribunal português passasse a ter características idênticas aos tribunais de Castela: sigilo no processo e inquisidores gerais designados pelo Rei. No mesmo ano saiu o primeiro rol de livros proibidos e deixaram de funcionar os Tribunais de Coimbra (restaurado em 1565), Porto, Lamego e Tomar.
Em 1552 o Santo Ofício recebeu seu primeiro Regimento, que só seria substituído em 1613. Em 1545 Damião de Góis tinha sido denunciado como luterano. Em 1548 Fernão de Pina, guarda-mor da Torre do Tombo e cronista geral do reino, sofreu idêntica acusação.
No Arquivo da Torre do Tombo encontra-se abundante documentação. Segundo a página da instituição na internet, para pesquisas, D. Diogo da Silva, primeiro inquisidor-mor, nomeou um conselho para o coadjuvar, composto por quatro membros. Este Conselho do Santo Ofício de 1536 foi a pré-figuração do Conselho Geral do Santo Ofício criado pelo cardeal D. Henrique em 1569 e que teve regimento em 1570. Entre as suas competências, saliente-se: a visita aos tribunais dos distritos inquisitoriais para verificar a actuação dos inquisidores, promotores e funcionários subalternos, o cumprimento das ordens, a situação dos cárceres. Competia-lhe a apreciação e despacho às diligências dos habilitandos a ministros e familiares do Santo Ofício, julgar a apelação das sentenças proferidas pelos tribunais de distrito, a concessão de perdão e a comutação de penas, a censura literária para impedir que entrassem no país livros heréticos; a publicação de índices expurgatórios; as licenças para impressão.

A Inquisição foi extinta gradualmente ao longo do século XVIII, embora só em 1821 se dê a extinção formal em Portugal numa sessão das Cortes Gerais.

Fim do texto de http://www.cafetorah.com/Historia-da-Inquisicao

E assim se conta a História dessa Grande Mancha, da maior, feita ao Cristianismo pela Igreja Católica Apostólica Romana.
























quarta-feira, 23 de setembro de 2015

Inquisição Portuguesa -1


Frade Dominicano Inquisidor  

Auto-de-Fé

Os autos-de-fé consistiam em cerimónias mais ou menos públicas onde eram lidas e executadas as sentenças do Tribunal do Santo Ofício (instituição criada pela Inquisição no século XVI). Inicialmente havia dois tipos de autos-de-fé:

1-     Os autos-de-fé que se realizavam no interior do Palácio da Inquisição ou num Convento, destinados exclusivamente aos “reconciliados” (aqueles que eram readmitidos no seio da Igreja e condenados a penas que iam desde penitências espirituais até à prisão e ao desterro;
2-     Os autos-de-fé que se realizavam na praça pública onde eram condenados não apenas os “reconciliados”, mas também os “relaxados” (aqueles que eram entregues à Justiça secular para execução da pena de morte.

Com o passar do tempo, os autos-de-fé passaram a constituir um grandioso espetáculo, realizado com grande pompa e segundo um cerimonial rigorosamente estabelecido. Assistiam a estas cerimónias não apenas as autoridades religiosas e civis (muitas vezes o próprio rei estava presente), mas toda a população da cidade que gritava em júbilo enquanto os condenados eram queimados vivos.



São Domingos de Gusmão,
Santo católico fundador da Ordem dos Pregadores, cujos membros são conhecidos como dominicanos, presidindo a um auto-de-fé (1475).
De Pedro Berruguete
Pintor espanhol cuja arte é considerada um estilo de transição entre a arte do Gótico e o Renascimento.
Visões artísticas que retratam o tema geralmente apresentam cenas de tortura e de pessoas queimando na fogueira durante os eventos/procedimentos, o que é historicamente difícil de se comprovar por documentos que façam referência a este tipo de violência da instituição que realizava e organizava a Santa Inquisição.


  
Auto-de-fé ou auto-da-fé refere-se a eventos de penitência realizados publicamente (ou em espaços reservados para isso) com humilhação de heréticos e apóstatas bem como punição aos cristãos-novos pelo não cumprimento ou vigilância da nova fé lhes outorgada, postos em prática pela Inquisição, principalmente em Portugal e Espanha.
As punições para os condenados pela Inquisição iam da obrigação de envergar um sambenito (espécie de capa ou tabardo penitencial), passando por ordens de prisão e, finalmente, em jeito de eufemismo, o condenado era relaxado à justiça secular, isto é, entregue aos carrascos da Coroa (poder secular, em oposição ao poder sagrado do clero). O estado secular procedia às execuções como punição a uma ofensa herética repetida, em consequência da condenação pelo tribunal religioso. Se os prisioneiros desta categoria continuassem a defender a heresia e repudiar a Igreja Católica, eram queimados vivos. Contudo, se mostrassem arrependimento e se decidissem reconciliar com o catolicismo, os carrascos procederiam ao "piedoso" acto de os estrangular antes de acenderem a pira de lenha.
Os autos de fé decorriam em praças públicas e outros locais muito frequentados, tendo como assistência regular representantes da autoridade eclesiástica e civil.


Inquisição Portuguesa

A Inquisição teve um pouco menos de Poder em Portugal e no vasto Império ultramarino português, do que nas Espanhas.



Isabel de Aragón
Reina consorte de Portugal
Princesa de Asturias y Gerona
Infanta de Castilla y Aragón

Os Reis Católicos não estavam satisfeitos de impor sua política pró-Inquisição nas Espanhas, tinham que impor em toda a Península Ibérica a perseguição dos hereges, dos judeus, e dos mouros, bem como o tratamento especial para os judeoconversos, para os marranos, para os B'nei anussim ( "filhos dos forçados" que designa os descendentes de judeus convertidos à força (anusim) ou Marrano é uma expressão hebraica genérica e conceito historiográfico que se refere aos judeus convertidos ao cristianismo dos reinos cristãos da Península Ibérica que "judaizavam", ou seja, que continuavam a observar clandestinamente seus antigos costumes e sua religião anterior), e isso foi feito através do contrato de casamento de sua filha mais velha,  a Infanta Dona Isabel de Aragão e Castela, com Dom Manuel I, o Venturoso, o soberano português na época do descobrimento do Brasil por Pedro Alvares Cabral, o grande Almirante do Mar Oceano.
No contrato do primeiro casamento de Dom Manuel I com de Dona Isabel de Aragão e Castela, seus pais, Fernando II de Aragão e de Isabel I de Castela, impuseram uma cláusula que “ exigia a expulsão dos hereges (mouros e judeus) do território português”.

Consequências importantes:
1-     O Rei tentou dissuadir a rainha, pois precisava dos recursos dos financistas judeus para o desenvolvimento de seu Plano Imperial de Conquistas d'Além-Mar em África, e ao longo do Mar Oceano;
2-     A nova Rainha não cedeu;
3-     Decreto de expulsão assinado por Dom Manuel em 5 de dezembro de 1496, “concedendo-lhes prazo até 31 de outubro de 1497 para que deixassem Portugal;
4-     “Aos judeus, Dom Manuel permitiu que optassem pela conversão ou desterro, esperando assim que muitos se batizassem, ainda que apenas proforma”;
5-     Muitos não acreditaram na promessa e a maioria optou por abandonar Portugal;
6-     Diante do grande êxodo, Dom Manuel mandou fechar o Porto de Lisboa para impedir a fuga;
7-     20 mil judeus ficaram concentrados no o Porto de Lisboa esperando aos navios de transportes, na sua maioria com destino aos Países Baixos, para Amsterdam;
8-     “Em abril de 1497, Dom Manuel mandou sequestrar as crianças judias menores de 14 anos, para serem criadas por famílias cristãs, o que foi feito com grande violência”;
9-     “Em outubro de 1497, os que ainda resistiram à conversão foram arrastados à pia batismal pelo povo incitado por clérigos fanáticos e com a complacência das forças da ordem”;
10- “ Foi desses batismos em massa e à força que surgiram os marranos, ou cripto-judeus, que praticavam o judaísmo em segredo embora publicamente professassem a fé católica”;
11- Os "cristãos novos" nunca foram realmente bem aceites pela população "cristã velha", que desconfiava da sinceridade da fé dos conversos.

Dona Isabel, Rainha Intransigente, morreu, em 28 de agosto de 1498, no  Palacio Arzobispal de Zaragoza, em Zaragoza, ao dar à luz o Príncipe Infante Miguel da Paz, herdeiro conjunto das coroas de Portugal, Castela (reconhecido como Príncipe das Astúrias) e Aragão (reconhecido Príncipe de Girona), e falecido precocemente em 1500, que pôs fim ao sonho da União Ibérica na sua pessoa.

  


Casamento de D. Manuel I de Portugal e Maria de Aragão


Rainha Dona Maria, Infanta de Aragão e Castela.

Dentro da política de viver bem com seu vizinho, Dom Manuel I casou com sua cunhada a Infanta Maria de Aragão e Castela em 30 de outubro de 1500.
Os novos contratos de casamento de Dom Manuel com a Infanta Maria de Aragão, também, haviam clausulas sobre os hereges, os judeus, os mouros, os judeoconversos, os marranos, os B'nei anussim, novamente impostas pelos Reis Católicos.
A nova Rainha se mostrou partidária “o projeto Imperial Manuelino para destruir as cidades sagradas islâmicas de Meca e Medina, anexar o Império Mameluco e conquistar os lugares santos do cristianismo, especialmente Jerusalém”, contudo, como sua irmã, e certamente influenciada pelos seu pais, era intransigente em relação aos Judeus.
E acontece, na minha visão, o maldito Pogrom de Lisboa.
Nesse Massacre de Lisboa de 1506 - de 19 a 21 de abril, na Semana Santa de 1506-  uma multidão ensandecida matou centenas de Judeus, ou seja, “ homens, mulheres e crianças foram torturados, massacrados e queimados em fogueiras improvisadas no Rossio, mais precisamente junto ao largo de São Domingos”.
A multidão foi influenciada pelos malditos padres da Igreja Católica que acusavam os hebreus de serem a causa de uma seca, fome e peste que assolavam o Reino.
“ Três dias de massacre se sucederam, incitados por frades dominicanos que prometiam absolvição dos pecados dos últimos 100 dias para quem matasse os hereges”.
Não podemos nos esquecer que a Inquisição ainda não havia sido estabelecida em Portugal.
Não podemos nos esquecer que haviam só passado “nove anos da conversão forçada dos judeus em Portugal, em 1497”.
Deveria haver mesmo centenas de judeus, pois “93 mil judeus refugiaram-se em Portugal nos anos que se seguiram à sua expulsão de Espanha em 1492 pelos Reis Católicos”.
Dom Manuel estava a caminho de Beja, para visitar a mãe, Dona Beatriz de Portugal, Duquesa de Viseu, e foi avisado dos acontecimentos em Lisboa
Mandou magistrados para tentar pôr fim ao banho de sangue, mas como as autoridades presentes quando do início da matança, foram obrigados a fugir.
Dois fatos acabaram com a Matança da Pascoa de 1506:
a-     O medo que os padres tiveram porque a plebe ignara matou o Escudeiro do Rei, João Rodrigues Mascarenhas, pessoa querida do Monarca, morto por engano;
b-    A chegada das Tropas Reais.

“D. Manuel I penalizou os envolvidos, confiscando-lhes os bens, e os dominicanos instigadores foram condenados à morte por enforcamento”.
“ Os representantes da cidade de Lisboa foram expulsos do Conselho da Coroa (equivalente ao atual Conselho de Estado), onde tinham assento desde 1385, quando o Rei Dom João I lhes concedeu esse privilegio pelo seu apoio à sua campanha pela conquista do Trono português”.
Entretanto, “muitas famílias judaicas fugiram ou foram expulsas do país, tendo como destino principal os Países Baixos e secundariamente, França, Turquia e Brasil, entre outros. Mesmo expulsos da Península Ibérica, os judeus só podiam deixar Portugal mediante o pagamento de "resgate" à Coroa. No processo de emigração, os judeus abandonavam suas propriedades ou as vendiam por preços irrisórios e viajavam apenas com a bagagem que conseguissem carregar”.

Como fruto do Massacre e consequente castigo dos culpados cresceu o antissemitismo em Portugal, que teve como consequência do estabelecimento do Tribunal do Santo Ofício — que entrou em funcionamento em 1540, perdurando até 1821.




Frades Dominicanos